domingo, 23 de agosto de 2009

Deus e a cultura moderna - parte 2

Continuação da reflexão do dia 21 de agosto de 2009
Ademais, todo o clima cultural inaugurado no século XVII e XVIII passando por todos os campos do conhecimento determinava o imperialismo do saber prático, da razão instrumental, fundando escolas de pensamentos que difundiam uma nova filosofia e estilo de comportamento e pensamento. Todo este período constitui uma movimentação na vida das religiões incidindo na crítica bíblica, instaurando o reino da razão instrumental, a força dominadora da técnica, primazia da razão instrumental sobre a comunicativa, surge a era da informática; elabora-se um projeto de uma cultura única, racional; imerge o efeito desestruturante das ciências e tecnologias; toda as produções culturais se ocupam de uma elaboração para as massas, até mesmo as religiões, principalmente a cristã; isso tudo desemboca no discurso reivindicando liberdade, a busca da felicidade em contraposição ao discurso religioso sobre a renúncia, do sacrifício, do desprendimento, da abnegação ... e do individualismo.[1] De tudo isso que constatamos, Deus passa a ser uma “hipótese possível” e o clima é este, “armam-se hipóteses, que são submetidas à experimentação e manipulação controlada para processos definidos. Compreende-se o que se experimenta. Experimenta-se o que se experimenta. Experimenta-se o que se constrói.”[2] É neste ambiente em que devemos compreender como o homem concebe a Deus e interpreta a manifestação de na Deus na história, e como este mesmo homem moderno se posta ante esta revelação, porque é de “dentro de suas experiências que o ser humano interpreta a revelação. (...) Em outras palavras, parte-se da pergunta da significação da revelação para o homem de hoje. Isso implica que tal revelação lhe fala a experiência.”[3] Com o advento da modernidade, as religiões, especialmente a cristã ficaram sem saber como trabalhar com essas questões, e aponta a todo este sistema que emergia os pontos de vista escolástico. Houve um trauma no qual ainda deixava a deriva todo um modelo de fé estruturado em dogmas. “O diálogo com o homem moderno se fez difícil.”[4]
Porém, de acordo com a capacidade de integração e inculturação que caracterizou a comunidade dos primeiros cristão, as religiões e o catolicismo de modo especial se procurasse entender a “modernidade unicamente como empecilho à revelação, isto suporia, no fundo, uma interpretação, maquinação da história, como se pudesse haver um tempo histórico de reino do mal. As idades antiga ou medieval seriam tempos de graça e a idade moderna de pecado.”[5] E na verdade, não é isso o que acontece. Como sempre dizemos, “os tempos mudaram” e as religiões precisam aprender que respostas devem ser dadas a todos os homens. O cristianismo, de modo especial, ao apresentar Deus aos modernos necessita de um novo impulso no ânimo para tal empresa. Apenas não se pode, como o fazem aqueles de outras denominações, se utilizar dos meios e discursos econômicos para subornar e causar dependência no povo pela realidade das pessoas que não utilizam da reflexão para saber discernir a verdadeira fé, ou melhor, para seguir de modo conciso uma fé sincera sem ideologias de dominação e escravização rebuscados de tratamentos de uma oratória sem um princípio ético digno.
Contudo, fato evidente aos olhos da era moderna, para além do fenômeno que observamos linhas atrás é o ateísmo conseqüente. Podemos constatar que o ateísmo é fato generalizado. “A primeira vista, nosso mundo aparece como ateu em sua globalidade, de forma que pode dizer-se que o ateísmo é um fenômeno massivo característico de nosso tempo.”[6] É a conseqüência evidente de um período que se entregou à reflexão existencial que possibilitava a hipótese da não existência de Deus e da vida do homem sem ele, não admitindo outra realidade que não seja a fáctica. O que se ventila nas diversas modalidades de reflexão é a busca da compreensão do homem a partir de si mesmo e por si mesmo. A questão da autonomia da reflexão do homem em relação a Deus é fator que existe na realidade contemporânea que não se pode deixar de lado. Na atualidade existe o forte apelo a autonomia, a uma compreensão da liberdade bem específica, a independência financeira ao direito individual, a privacidade. Confirma Juan Lucas: “Trata-se de uma nova forma de humanismo que impulsiona à humanidade até a sua maioridade, rechaçando toda dependência e aspirando a uma autonomia completa do destino.”[7]
MDT
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[1] cf. LIBANIO, João Batista. Teologia da revelação a partir da modernidade. São Paulo: Loyola, 1992. p. 147
[2] LIBANIO, 1992, p. 117
[3] id. Ibid., p. 167
[4] id. Ibid., p. 167
[5] id. Ibid., p. 168
[6] LUCAS, op., cit., p. 284
[7] id. Ibid., p. 284

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